Ribeirão Preto - A 2ª Vara do Trabalho de Franca (SP) concedeu liminar favorável ao Ministério Público do Trabalho, determinando o bloqueio de ativos financeiros no limite de R$ 300 mil, bem como o bloqueio e indisponibilidade de veículos e imóveis de dois acusados de praticar tráfico internacional de pessoas e manter trabalhadores transexuais em regime de servidão por dívida. Os recursos vão ser usados no pagamento de rescisão indireta de contrato de trabalho. A decisão também autoriza expressamente o ingresso dos trabalhadores no programa de seguro-desemprego, independente de anotação do contrato em carteira de trabalho. Ao todo, 13 pessoas foram beneficiadas.
A decisão da juíza Eliana dos Santos Alves Nogueira atende aos pedidos feitos, em ação civil pública, pela procuradora Regina Duarte da Silva, do MPT, em Ribeirão Preto. Os réus, que estão sob a custódia do Estado, têm 10 dias para apresentar defesa, a partir da intimação. Eles foram presos durante a operação Fada Madrinha, realizada no útlimo dia 9 de agosto. A ação resultou no cumprimento de três mandados de prisão preventiva e oito de busca e apreensão, nos municípios de Franca, São Paulo, Aparecida de Goiânia, Goiânia, Jataí, Rio Verde e Leopoldina. Os aliciadores investigados pelo MPT, Ministério Público Federal e Polícia Federal, traficaram dezenas de transexuais para a Itália, além de submetê-los à servidão por dívidas, configurando redução de pessoas a condições análogas à escravidão.
Para habilitar o benefício do seguro-desemprego, os trabalhadores devem apresentar a cópia da decisão, que funcionará como alvará judicial.
As investigações que levaram à operação Fada Madrinha revelaram que as vítimas, todas transexuais, eram aliciadas pelas redes sociais mediante promessas de transformação corporal para a participação em concursos de beleza. Nessas cirurgias, eram utilizadas próteses mamárias reaproveitadas ou de baixíssima qualidade. Os investigados aplicavam silicone industrial nas nádegas, pernas e rosto das vítimas, produto utilizado para lubrificar maquinário e motores, proibido pela Anvisa devido ao seu alto grau de nocividade à saúde humana.
Os preços cobrados pelas intervenções estéticas eram superfaturados, de modo a impor às vítimas dívidas altíssimas. Como forma de pagar pelo sonho da transformação corporal, os transexuais aceitavam realizar programas de natureza sexual nas ruas da cidade, nas casas onde ficavam hospedados junto com os aliciadores e em motéis, a qualquer hora do dia. Os investigados cobravam diária de R$ 170, sendo R$ 70 para hospedagem e alimentação, R$ 50 para aquisição de roupas, perucas, sapatos e outros acessórios – também fornecidos exclusivamente pelos aliciadores, e R$ 50 da chamada “poupança da transição”, para financiar os procedimentos estéticos.
Algumas vítimas eram enviadas para a Itália com outra falsa promessa: ganhar dinheiro fácil e ser uma estrela de concursos internacionais de beleza. Na verdade, elas já saíam do Brasil com dívidas e obrigadas a pagar os custos de ida e de estadia no país. Os transexuais explorados não tinham como voltar ao Brasil e eram novamente submetidos à exploração sexual. As investigações continuam em andamento.