O trabalho escravo ainda existe no país por causa da impunidade. A opinião é do presidente da Comissão Regional sobre Trabalho Escravo do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (TRT10), desembargador Brasilino Ramos. “Quando o empregador submete o trabalhador a uma situação desta está apostando na impunidade. Se ele tivesse certeza que seria punido, não faria. É uma questão de conscientização do empregador”, afirma.
Segundo o magistrado, os casos de trabalho escravo na 10ª Região acontecem principalmente no Tocantins, onde pessoas são arregimentadas em estados como Maranhão e Pará para prestação de serviços na zona rural. Os processos que chegam ao TRT10 geralmente são de empregadores (fazendeiros e empresários) que foram incluídos no Cadastro de Trabalho Escravo do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) ou autuados pela fiscalização.
Na avaliação do desembargador Brasilino Ramos, um agravante no trabalho escravo é a dificuldade de a vítima se reinserir no mercado de trabalho. “Às vezes, o trabalhador é liberto, mas não encontra apoio para ser reinserido no mercado de trabalho e acaba novamente sendo submetido ao trabalho escravo. É uma chaga social. É lamentável que, em pleno século 21, a gente se depare com trabalhadores submetidos a condições sub-humanas”, diz.
Tocantins
O titular da 2ª Vara de Palmas (TO), juiz Francisco Rodrigues de Barros, aponta que os casos de trabalho escravo na região têm diminuído devido às ações do MTE, Ministério Público do Trabalho e Polícia Federal. No estado, sob a coordenação da Secretaria de Cidadania e Justiça, foi instituída a Comissão para Erradicação do Trabalho Escravo, com representantes de diversas entidades, dentre as quais a Justiça do Trabalho.
Para o magistrado, a aprovação da PEC do Trabalho Escravo irá facilitar o combate à prática, mas são necessárias outras medidas de repressão e também de prevenção, até porque o crime não acontece apenas na zona rural. “Não há dúvidas de que a legislação atual não se mostra totalmente satisfatória para a solução do problema. Ela deve ser mais combativa, criando meios eficazes de definição, apuração, punição e também de orientação preventiva, além de criar mecanismos para inserção no mercado de trabalho daqueles indivíduos libertados”, sustenta.
Ministério Público
A procuradora do Trabalho da 10ª Região Paula de Ávila e Silva Porto Nunes destaca que o Brasil é citado internacionalmente por causa da conceituação de trabalho escravo. Na sua avaliação, a PEC do Trabalho Escravo é um avanço, desde que não altere a definição do crime, como está sendo discutido no Congresso Nacional.
Ela cita que o caso mais recente de trabalho escravo na 10ª Região foi detectado no mês passado durante uma fiscalização, que contou com o auxílio da Polícia Rodoviária Federal, no município de Lagoa da Confusão, que fica a aproximadamente 300 quilômetros de Palmas. Foram resgatados 46 trabalhadores, que lidavam com a limpeza do terreno da Fazenda Colorado para ser utilizado para o agronegócio.
No local, o banheiro não funcionava, não havia lugar adequado para a refeição, e os trabalhadores tomavam banho no córrego, pagavam pelos equipamentos de proteção individual, sendo descontado o valor deles, estavam com os salários atrasados e sem anotações na carteira de trabalho.
Oficina
Em setembro do ano passado, o TRT10 promoveu a oficina “Trabalho decente e a coletivização do processo”, uma parceria da Escola Judicial do Tribunal com a Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae) e a Secretaria Nacional de Direitos Humanos. Na abertura, a presidente do TRT10, desembargadora Elaine Vasconcelos, afirmou que as pessoas com acesso à informação precisam estar empenhadas no combate ao trabalho escravo em todas as suas nuances, em prol da afirmação do princípio da dignidade humana.
A diretora da Escola Judicial, desembargadora Flávia Falcão, lembrou que o trabalho escravo já não está apenas no campo e que, por isso, é fundamental debater o assunto. “Sempre que imaginamos trabalho escravo, pensamos em lavouras. No entanto, ele também está no meio urbano. Aí nos perguntamos: Como é possível que isso esteja acontecendo do nosso lado e com tamanha brutalidade? Este é um momento de reflexão para todos nós”, declarou.
O coordenador-geral do Conatrae, José Guerra, frisou que o trabalho escravo urbano é um desafio que se apresenta desde o final da primeira década dos anos 2000. Segundo ele, desde 2005, quando o Brasil assumiu a existência de trabalho escravo em seu território, mais de 45 mil trabalhadores já foram libertados.
O procurador do Trabalho da 24ª Região Jonas Ratier Moreno definiu as condições que identificam o trabalho escravo contemporâneo: existência de trabalho forçado, jornada exaustiva, restrição de locomoção e condições degradantes. A juíza do Trabalho da 3ª Região (Minas Gerais) Martha Halfeld Schmidt demonstrou a necessidade de atualização do conceito contemporâneo de escravidão no trabalho, que se caracter