Um ex-funcionário da empresa Brasil Kirin Indústria de Bebidas S.A. conseguiu demonstrar, por meio de depoimento próprio e de testemunhas, que realizava uma jornada de trabalho superior a 10h diárias e que o adicional pelo período extraordinário não era pago regularmente. Os demais integrantes da 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região (TRT-PE), seguindo o voto da relatora desembargadora Eneida Melo Correia de Araújo, decidiram que o espelho de ponto apresentado pelo empregador possuía indícios de fraude. Assim, foi dado provimento ao recurso do ex-empregado neste aspecto.
No processo, o trabalhador pediu o pagamento de horas-extras, alegando que, de segunda a sábado e em dois domingos do mês, iniciava as atividades às 13h40 e encerrava à 01h da manhã, tendo apenas meia hora de intervalo. A empresa, por sua vez, argumentou que toda jornada extraordinária foi paga ou compensada com folga e que os horários de entrada e saída estavam devidamente registrados no espelho de pontos.
O ex-funcionário contestou, afirmando que os lançamentos não eram realistas, que, apesar de bater o ponto todos os dias, a folha de registro só chegava para ele dois ou três meses depois, o que dificultava o controle. Também declarou fictício o sistema de banco de horas, pois nunca pôde usufruir do tempo acumulado. Os argumentos foram reforçados por uma testemunha ouvida no processo, bem como por um depoimento, feito em outra ação contra a mesma empresa, utilizado como prova emprestada.
“Diante de tais declarações, entendo que não podem prevalecer os controles de jornada apresentados pela Sociedade Empresária, porquanto sobre eles recai a existência de graves indícios de fraude”, expôs a relatora Eneida Melo. O modelo de banco de horas também foi rejeitado, pois o empregado fazia mais de duas horas extras por dia, ultrapassando o máximo permitido em lei, e prestava o serviço extraordinário diariamente, o que descaracteriza a compensação de jornada, conforme Súmula 85 do Tribunal Superior do Trabalho (TST).
Desconsiderando o espelho de pontos e examinando as demais provas processuais, a relatora arbitrou uma jornada das 13h40 à 01h, de segunda a sábado e em um domingo do mês, com intervalos intrajornada de uma hora em quatro dias da semana e no domingo trabalhado e de 30 minutos nos outros dois dias. Com base nisso, a indústria de bebidas deverá pagar como extras todas as horas que ultrapassaram a oitava diária e a quadragésima quarta semanal ao longo do contrato de trabalho e em dobro os dias trabalhados no domingo. Também incidirão repercussões em verbas como 1/3 de férias, gratificação natalina e FGTS.
Além da contraprestação pela jornada extraordinária, o ex-funcionário requereu a indenização a título de danos morais, declarando que, por conta do movimento e peso da atividade de carregar e descarregar grades de bebidas, desenvolveu problemas no ombro. A empresa afirmou que possuía equipamentos para auxiliar nesses processos e que, em nenhum momento durante o contrato, o reclamante se afastou por conta de doença laboral. O perito convocado no processo solicitou um exame de ressonância magnética para concluir o laudo, mas o trabalhador não forneceu. A magistrada Eneida Melo afirmou que, sem provas que indicassem que a doença foi causada pelo trabalho, não caberia culpar a empresa.
Texto: Helen Falcão
Fonte: www.trt6.jus.br